Em ambiente corporativo cada vez mais complexo, com cadeias de fornecedores globais e pressão por eficiência operacional, as empresas enfrentam riscos internos e externos simultâneos.
Segundo o relatório da Association of Certified Fraud Examiners (ACFE), as organizações perdem em média 5% da receita anual com fraudes ocupacionais. Em outra pesquisa da KPMG International, 71% das empresas das Américas relataram ter vivenciado fraudes no último ano e 55% pagaram multas regulatórias ou sofreram perdas por falhas de compliance.
Num cenário em que falhas de governança, controle interno ou alinhamento cultural acabaram em escândalos que não se restringem a perdas financeiras, torna-se fundamental que os gestores de compliance busquem abordagens mais preventivas, não apenas reativas.
É aí que entra o conceito de KYE (Know Your Employee), uma extensão lógica das práticas já consolidadas de KYC (Know Your Customer) ou KYP (Know Your Partner) para o universo interno da empresa.
O KYE é uma prática de compliance focada em verificar, validar e monitorar o histórico, identidade e a integridade dos funcionários ao longo de toda a sua jornada na empresa. Ele funciona como uma espécie de due diligence interna, que complementa o background check tradicional, mas acompanha mudanças de comportamento, acessos sensíveis e eventuais vínculos externos de risco.
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Por que a adoção do KYE importa?
Escândalos internos como foco estratégico
Os escândalos corporativos, sejam fraudes financeiras, desvios de conduta ética ou falhas de governança, muitas vezes têm origem em fatores operacionais ou humanos que passaram despercebidos. Segundo a ACFE, o valor médio de perda por caso de fraude ocupacional no último ano foi de cerca de US$ 145.000, considerando 1.921 casos.
Por que isso importa para o gestor de compliance ou de RH?
Porque, além das perdas diretas, a reputação da organização pode ficar comprometida, os controles internos são questionados e, em última instância, o valor de mercado e a confiança de stakeholders sofrem impacto.
Sob a ótica do gestor de RH, os efeitos se aprofundam ainda mais: aumenta o turnover, cresce a dificuldade de retenção de talentos e se fragiliza a segurança psicológica das equipes. Em outras palavras: não basta cumprir a letra da governança, é preciso entender o risco humano por trás.
O gap entre controle e comportamento humano
Muitas empresas investem fortemente em políticas de compliance, treinamento, códigos de conduta e, ainda assim, os riscos persistem. Como o artigo da Harvard Business Review destaca, programas de compliance falham frequentemente não por falta de regras, mas porque desconsideram a cultura organizacional, comportamento humano e monitoramento contínuo.
É no “quem está fazendo o trabalho e tem acesso a dados críticos” que reside uma falha estratégica. E é aí que o KYE se mostra decisivo, pois coloca o colaborador, seu histórico, integridade e perfil de risco no radar da governança corporativa.
Como estruturar um programa de KYE eficaz
A implementação de um programa de Know Your Employee (KYE) exige método, clareza operacional e integração consistente entre governança, tecnologia e gestão de pessoas. Para que o processo seja efetivo, é necessário estruturar uma abordagem que considere desde a definição de riscos até o monitoramento contínuo dos colaboradores.
A seguir, apresentamos um caminho prático para orientar a implementação ou o aprimoramento de um programa de KYE consistente.
1. Diagnóstico e definição de universo de risco
A implementação de um programa de Know Your Employee exige um diagnóstico rigoroso sobre os riscos da organização. Isso significa mapear e segmentar colaboradores, funções, áreas e níveis de acesso que apresentam maior probabilidade de impactar negativamente a governança corporativa.
É nesse momento que a empresa identifica posições críticas, como finanças, compras, tecnologia e demais áreas reguladas que demandam verificações mais robustas. Essa análise deve considerar também o perfil de risco já registrado nas bases internas de RH e compliance.
Além disso, é essencial observar potenciais red flags, como recorrência de alertas disciplinares, rotatividade em posições-chave, alterações inesperadas de alocação e acesso a sistemas estratégicos.
Com esses insumos, a empresa consegue definir critérios claros para determinar quem deve passar por verificações de KYE.
Por fim, esse escopo deve ser alinhado aos pilares de compliance, às diretrizes de governança corporativa e, quando aplicável, à agenda ESG.
Somente assim o diagnóstico inicial garante que o programa de KYE seja eficiente, assertivo e proporcional ao risco, evitando a criação de processos genéricos que desperdicem recursos ou gerem resistência interna.
2. Construção de política, procedimentos e governança
Com o universo de risco devidamente mapeado, o passo seguinte consiste em estruturar formalmente a política interna de KYE. Essa política deve dialogar com o código de conduta, com as normas de compliance trabalhista e com a matriz de riscos corporativa, estabelecendo diretrizes claras para o pré-onboarding, o onboarding e o monitoramento contínuo dos colaboradores ao longo do vínculo empregatício.
A governança precisa definir com precisão os papéis e responsabilidades de cada área envolvida (RH, compliance, TI, auditoria interna e lideranças das unidades de negócio), assegurando que todas as etapas do processo tenham proprietários definidos.
Também é indispensável integrar o KYE com programas já existentes, como background check, validação de identidade e due diligence de terceiros (TPRM), preservando coerência metodológica e evitando redundâncias.
Outro eixo essencial envolve a governança de dados: determinar como informações sensíveis serão tratadas, quem terá permissão de acesso, qual será a periodicidade das revisões e quais mecanismos assegurarão conformidade com a LGPD.
Para consolidar o processo, indicadores de desempenho, como número de verificações concluídas, quantidade de alertas, tempo médio de resposta e registros de casos escalados, devem ser monitorados e revisados periodicamente, garantindo a eficácia e evolução contínua da política.
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3. Implementação de verificações e validações
A etapa de implementação é a transição do planejamento para a prática, momento em que os processos de verificação e validação se materializam. As verificações de background check e validação de identidade são a base desse estágio porque asseguram a confirmação de dados como documentos, qualificações e eventuais registros criminais.
Além disso, é imprescindível realizar a validação e o saneamento contínuo dos dados cadastrais, garantindo integridade, atualização e precisão das informações, especialmente quando se trata de funções estratégicas ou de alto impacto operacional.
Lembre-se de que a verificação não pode se limitar ao momento da admissão; estudos como os da Workforce Group reforçam que a triagem periódica permite identificar mudanças de comportamento, condições financeiras sensíveis ou envolvimentos legais que podem elevar o risco interno.
Ferramentas de monitoramento, apoiadas por alertas de red flags, desempenham papel central nessa fase, pois permitem identificar transações incomuns, acessos excessivos, alterações de função ou reclamações atípicas que demandem investigação.
A integração dos resultados com auditoria interna e liderança das áreas é essencial para assegurar que as informações geradas realmente influenciem decisões de acesso, realocação ou monitoramento diferenciado.
Todo o processo deve ser devidamente registrado, documentado e protegido, conforme os requisitos de confidencialidade da LGPD e normas internacionais de proteção de dados.
4. Cultura, engajamento e reporte
Nenhum programa de KYE se sustenta apenas por processos técnicos, por isso, é indispensável que a cultura organizacional ofereça suporte real ao modelo. Isso começa pelo alinhamento com os pilares de compliance e recrutamento e seleção.
Quando o KYE é interpretado como um mecanismo de proteção coletiva e fortalecimento institucional, e não como instrumento de desconfiança, a aceitação cresce de forma mais orgânica.
O KYE deve ser um instrumento de governança, nunca de exclusão.
A adoção do KYE precisa ser acompanhada de um princípio fundamental: o processo não pode, em hipótese alguma, ser utilizado como ferramenta de discriminação, segregação ou julgamento subjetivo sobre colaboradores.
O propósito central do KYE é proteger a empresa contra riscos operacionais, reputacionais e legais, garantindo que decisões sejam tomadas com base em critérios objetivos, alinhados à legislação trabalhista e à LGPD.
O foco não é rotular pessoas, mas antecipar riscos que possam ameaçar a integridade da organização, preservar a segurança do ambiente de trabalho e fortalecer a confiança mútua entre empresa e equipe.
5. Avaliação, melhoria contínua e tecnologia
A última etapa garante que o programa de KYE não se torne estático. A avaliação contínua deve incluir o monitoramento de indicadores como incidentes evitados, tempo e custo das verificações, percentual de colaboradores em funções críticas sob monitoramento, volume de alertas tratados e tempo médio de investigação.
Esse processo também precisa acompanhar as exigências legais e regulatórias que reforçam a importância do monitoramento contínuo, como a Lei 14.811, que determina verificações recorrentes de antecedentes em determinadas funções, além das recomendações anticorrupção e portarias do COAF voltadas à identificação de movimentações suspeitas e conflitos de interesse.
Integrar esses requisitos ao programa evita lacunas de compliance, assegura conformidade e dá mais solidez ao sistema de controle interno da empresa.
Auditorias periódicas são fundamentais para revisar a aderência às políticas, verificar a atuação das áreas envolvidas e identificar fraquezas que possam comprometer o fluxo de controle.
À medida que o ambiente corporativo evolui com novas normas regulatórias, mudanças na composição da força de trabalho e adoção de modelos híbridos, os critérios de risco devem ser atualizados, mantendo o programa relevante e eficaz.
A tecnologia é o eixo acelerador desse processo, por isso, investimentos em automação, inteligência artificial, biometria, verificação digital de identidade, monitoramento contínuo e análise preditiva ampliam a capacidade de detecção e reduzem custos operacionais.
Por fim, o programa deve estar alinhado às normas internacionais de compliance, como ISO 37301 e ISO 31000, garantindo padronização, governança sólida e integração com os demais componentes do sistema corporativo de gestão de riscos.
Onde o KYE ajuda a evitar escândalos corporativos
Proteção de imagem e reputação
Escândalos corporativos muitas vezes começaram com lapsos humanos, comportamentos não monitorados ou falhas de verificação que permitiram que colaboradores ou executivos pudessem atuar fora dos padrões esperados.
Ao implementar o KYE, a empresa demonstra ao mercado e aos stakeholders que leva a sério a integridade do quadro de pessoal, reduzindo o risco de estar associada a fraudes ou condutas ilícitas.
Redução de perdas financeiras e operacionais
Como vimos, as perdas por fraude interna podem ser significativas. O KYE ajuda a reduzir a probabilidade de contratação ou manutenção de colaboradores de alto risco ou que já apresentaram sinais de alerta, o que se traduz em menor custo de investigação, de perdas e de impacto nos negócios.
A pesquisa da ACFE enfatiza que a detecção tardia de fraude aumenta as perdas. Então, ao antecipar o risco humano, o KYE atua diretamente na linha de frente da prevenção.
Aumento da eficiência e automação
Aplicar verificações manuais para todos os colaboradores e monitorá-los continuamente seria impraticável e custoso.
A utilização de tecnologia (IA, biometria, dashboards de risco, alertas automáticos) permite fazer o KYE de forma escalável e ágil, e esse ganho de velocidade e qualidade é fundamental para que o compliance não fique obsoleto frente aos riscos em tempo real.
Alinhamento com terceiros e fornecedores
Embora o foco principal do KYE sejam os colaboradores, muitas vezes os escândalos corporativos envolvem conluio, terceiros ou fornecedores. O KYE complementa programas de TPRM (Third Party Risk Management) e due diligence de fornecedores, garantindo que o elo interno não se torne vulnerável por ausência de verificação.
Leia também: PGR e TPRM: como conectar compliance regulatório e riscos de terceiros em um sistema de governança
Checklist do KYE para gestores de compliance e rh
Para facilitar a aplicação, seguem os principais componentes que um gestor de compliance deve assegurar em seu programa de KYE:
- Definição clara de papéis, responsabilidades e governança (RH, compliance, auditoria, TI).
- Política interna formal de KYE, integrada ao código de conduta e matriz de riscos.
- Segmentação de colaboradores por nível de risco, função e acesso.
- Procedimentos de pré-onboarding, onboarding e monitoramento contínuo (pós-admissão).
- Verificações de background check, validação de identidade, consulta a listas restritivas, identificação de PEPs, vínculos empresariais.
- Automação, uso de IA e monitoramento de alertas para “mudanças de risco” no perfil do colaborador.
- Proteção de dados pessoais e conformidade com LGPD/GDPR.
- Comunicação interna e treinamento para engajamento e cultura.
- Indicadores de desempenho (KPIs) e reporte para a alta liderança ou conselho.
- Auditoria periódica e melhoria contínua do programa, com base em incidentes ou mudanças no ambiente de risco.
As estatísticas falam por si: escândalos corporativos, fraudes internas, desvios de conduta e falhas de governança continuam sendo ameaças reais aos negócios não apenas no Brasil, mas globalmente.
Sabemos que as perdas médias em um caso de fraude são superiores a US$ 145.000 e que as empresas perdem cerca de 5% da sua receita anual em fraudes ocupacionais. Em meio a esse cenário, o programa de compliance não pode ignorar o fator humano interno, é aqui que o KYE assume papel estratégico.
Aplicar o Know Your Employee significa que a empresa decide conhecer não apenas seus clientes e fornecedores, mas sobretudo os seus colaboradores de forma sistemática, segmentada, contínua e tecnologicamente suportada.
Isso amplia a visão de risco, fortalece a governança corporativa, protege a reputação, reduz perdas e torna a empresa mais resiliente frente aos escândalos.
A tecnologia é o facilitador que permite escalar esse programa sem que ele se torne oneroso ou manualmente impossível. Como vimos, soluções de verificação de identidade, monitoramento contínuo e alertas proativos já estão disponíveis e devem ser parte central de qualquer programa KYE eficaz.
Nesse contexto, a Netrin atua como especialista em soluções de background check, automação de processos de compliance, a Netrin apoia sua empresa a estruturar, implantar e gerir um programa de KYE com agilidade, segurança e profundidade.
Alinhando tecnologia, governança e cultura corporativa, a Netrin ajuda você a transformar o conceito de “conheça o seu colaborador” em uma prática operacional robusta e integrada ao ciclo de controle de risco da sua organização.
Se você é gerente de compliance ou responsável por governança corporativa, considerar o KYE como parte estruturada da sua agenda não é apenas recomendável, é absolutamente necessário para evitar que o próximo escândalo comece por dentro.
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